I CONGRESSO NACIONAL DE CONDIÇÕES DE TRABALHO
«Assédio Moral – trajectórias pessoais e práticas de intervenção»
«Assédio Moral – trajectórias pessoais e práticas de intervenção»
Resumo da comunicação apresentada por Rui Moura, Célia Quintas, Dilar Costa e Luísa Ribeiro [1]
O estudo sobre o Assédio Moral no Trabalho foi realizado pela Universidade Autónoma de Lisboa e promovido pela Autoridade para as Condições de Trabalho com o objectivo de aprofundamento do tema em situações concretas de ocorrência, especialmente natureza, contextos, condições, estratégias, modalidades de agressão física, psicológica ou outra, características de agressores e agredidos e problemas de saúde resultantes.
OBJECTIVOS
Os principais objectivos específicos consistiam em identificar:
(a) os tipos do assédio moral no trabalho;
(b) o perfil das vítimas;
(c) o perfil dos agressores;
(d) os comportamentos dos agressores nos locais de trabalho e os comportamentos das vítimas;
(e) os contextos, as condições de ocorrência e a duração do assédio moral no trabalho;
(f) as estratégias usadas pelos agressores e pelas vítimas durante as ocorrências;
(g) os impactes no estado de saúde físico e psíquico da vítima;
(h) os progressos e obstáculos relativos à problemática do assédio moral no trabalho a partir da criação de legislação sobre a matéria;
(i) estratégias, processos e práticas de prevenção susceptíveis de diminuir a incidência do assédio moral;
(j) recomendações de programas e de alterações jurídicas sobre o assédio moral.
NOÇÃO E DIMENSÃO DO ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO
Na óptica de Hirigoyen (2002), o assédio moral no trabalho pode ser definido como qualquer comportamento abusivo que atente contra a dignidade ou a integridade psíquica e ou física de uma pessoa, cujas consequências fazem perigar o emprego ou as condições de trabalho envolventes.
A Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho (AESST) usa a expressão bullying para definir os comportamento repetidos e sem razoabilidade destinados a gerar riscos para a saúde e segurança dos empregados.
A Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho relata, no Relatório do 3.º Inquérito (2000), que, no universo da população trabalhadora da União Europeia em 2000 (159 milhões), 6% (9 milhões) de trabalhadores são vítimas de violência física e 18% (27 milhões) são alvo de violência verbal (incluindo assédio e discriminação).
LEGISLAÇÃO E TIPOLOGIAS DO ASSÉDIO MORAL
O Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, criou uma nova divisão dedicada exclusivamente à “proibição de assédio”, na qual abrigou o artigo 30.º que, sob a epígrafe “assédio”, dispunha o seguinte: “Entende-se por assédio o comportamento indesejado, nomeadamente o baseado em factor de discriminação, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação profissional, com o objectivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afectar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador”.
O assédio vertical descendente (bossing) é o tipo mais comum e caracteriza-se pela circunstância de o assediador ser o superior hierárquico ou o empregador do assediado, associando práticas de abuso de poder.
O assédio moral vertical também pode ter o sentido ascendente, nos casos em que é o subordinado que actua como assediador do superior hierárquico, ou o trabalhador que actua como assediador do empregador.
Menos frequente, o assédio moral horizontal caracteriza-se pela inexistência de uma relação hierárquica entre o agente e a vítima (inexistência de subordinação).
O Código do Trabalho propõe, ainda, a possibilidade de o Assédio Moral ser praticado por indivíduos não integrados na estrutura organizacional (clientes, fornecedores, etc.).
CONCLUSÕES
O estudo mostrou a dificuldade de distinguir situações de assédio e situações conflituais que ocorrem nas organizações. Isso contribui para que as vítimas não reajam, nem no quadro das relações de trabalho, nem através dos mecanismos legais, resultando na ineficácia dos instrumentos legislativos, na impunidade dos agentes e na desprotecção das vítimas.
A temporalidade do fenómeno é outro problema, porque há situações em que o assédio não assume repetitividade, consumando-se num acto único e visível para todos, visando gerar um efeito de paralisia do colectivo. O fenónemo é intencional e praticado para fragilizar moral e psicologicamente o assediado, visando objectivos pessoais ou organizacionais.
A pressão, o stress, os objectivos e metas difíceis de atingir, as crises económicas e financeiras, as reestruturações empresariais, as novas tecnologias, a mudança radical nas formas de organização do trabalho e a utilização de novas técnicas de gestão de dominação (avaliação individual do desempenho, qualidade total como objectivo e não meta referencial, reestruturações com demissões e realocação de pessoal e terciarização/precarização de serviços), incrementaram atitudes e comportamentos intencionalmente conducentes ao assédio moral no trabalho, determinando a supressão de solidariedades e abrindo espaço ao autoritarismo.
Parece inequívoco que todos os relatos são conotados com situações de abuso de poder, e é inquestionável a associação das situações de violência e deterioração das relações aos estilos de liderança autocrática. Efectivamente, a cultura organizacional e o exercício da liderança afiguram-se decisivos. O exercício do poder sem balizas éticas e a falta de formação das chefias mostram-se fulcrais na facilitação do assédio moral, bem como a ausência de fiscalização, originada pela dificuldade de se identificar o fenómeno e de se obter testemunhas disponíveis.
As instituições de apoio à vítima apontam os custos e as consequências do assédio, sobretudo o clima de stress e de medo, que quebra os laços sociais, destrói a noção de equipa e gera desequilíbrios psicológicos graves com quebra de confiança, menor produtividade e problemas que podem levar à depressão e até mesmo ao suicídio.
Acresce que o assédio moral é protegido em certos departamentos de gestão de recursos humanos em tempo de reestruturações que forçam despedimentos, bem como se treina dirigentes, em diversas partes do mundo, para melhor dominar as potenciais vítimas.
Face a tais realidades, é fundamental que a empresa valorize o capital humano e reforce a auto-estima dos trabalhadores, protegendo-se do assédio moral. Tal perspectiva é essencial para se desenvolverem práticas envolvendo os stakeholders na procura de consensos e compromissos, que canalizem energias para projectos comuns. As novas empresas usam técnicas fundadas na transparência, responsabilidade e desenvolvimento ecossocioeconómico num quadro ético e de resgate do rosto humano da empresa.
Acresce, finalmente, que a AESST refere a crescente importância dos riscos psicossociais e a OIT reconhece que o assédio moral é um dos grandes temas emergentes no século XXI no que respeita a problemas de saúde no trabalho.
[1] Rui Moura (coordenador científico do estudo) é o Coordenador da ‘Linha de Investigação das Condições de Trabalho’ na Universidade Autónoma de Lisboa; Célia Quintas, Dilar Costa e Luísa Ribeiro são membros da ‘Linha de Investigação das Condições de Trabalho’.
O estudo sobre o Assédio Moral no Trabalho foi realizado pela Universidade Autónoma de Lisboa e promovido pela Autoridade para as Condições de Trabalho com o objectivo de aprofundamento do tema em situações concretas de ocorrência, especialmente natureza, contextos, condições, estratégias, modalidades de agressão física, psicológica ou outra, características de agressores e agredidos e problemas de saúde resultantes.
OBJECTIVOS
Os principais objectivos específicos consistiam em identificar:
(a) os tipos do assédio moral no trabalho;
(b) o perfil das vítimas;
(c) o perfil dos agressores;
(d) os comportamentos dos agressores nos locais de trabalho e os comportamentos das vítimas;
(e) os contextos, as condições de ocorrência e a duração do assédio moral no trabalho;
(f) as estratégias usadas pelos agressores e pelas vítimas durante as ocorrências;
(g) os impactes no estado de saúde físico e psíquico da vítima;
(h) os progressos e obstáculos relativos à problemática do assédio moral no trabalho a partir da criação de legislação sobre a matéria;
(i) estratégias, processos e práticas de prevenção susceptíveis de diminuir a incidência do assédio moral;
(j) recomendações de programas e de alterações jurídicas sobre o assédio moral.
NOÇÃO E DIMENSÃO DO ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO
Na óptica de Hirigoyen (2002), o assédio moral no trabalho pode ser definido como qualquer comportamento abusivo que atente contra a dignidade ou a integridade psíquica e ou física de uma pessoa, cujas consequências fazem perigar o emprego ou as condições de trabalho envolventes.
A Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho (AESST) usa a expressão bullying para definir os comportamento repetidos e sem razoabilidade destinados a gerar riscos para a saúde e segurança dos empregados.
A Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho relata, no Relatório do 3.º Inquérito (2000), que, no universo da população trabalhadora da União Europeia em 2000 (159 milhões), 6% (9 milhões) de trabalhadores são vítimas de violência física e 18% (27 milhões) são alvo de violência verbal (incluindo assédio e discriminação).
LEGISLAÇÃO E TIPOLOGIAS DO ASSÉDIO MORAL
O Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, criou uma nova divisão dedicada exclusivamente à “proibição de assédio”, na qual abrigou o artigo 30.º que, sob a epígrafe “assédio”, dispunha o seguinte: “Entende-se por assédio o comportamento indesejado, nomeadamente o baseado em factor de discriminação, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação profissional, com o objectivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afectar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador”.
O assédio vertical descendente (bossing) é o tipo mais comum e caracteriza-se pela circunstância de o assediador ser o superior hierárquico ou o empregador do assediado, associando práticas de abuso de poder.
O assédio moral vertical também pode ter o sentido ascendente, nos casos em que é o subordinado que actua como assediador do superior hierárquico, ou o trabalhador que actua como assediador do empregador.
Menos frequente, o assédio moral horizontal caracteriza-se pela inexistência de uma relação hierárquica entre o agente e a vítima (inexistência de subordinação).
O Código do Trabalho propõe, ainda, a possibilidade de o Assédio Moral ser praticado por indivíduos não integrados na estrutura organizacional (clientes, fornecedores, etc.).
CONCLUSÕES
O estudo mostrou a dificuldade de distinguir situações de assédio e situações conflituais que ocorrem nas organizações. Isso contribui para que as vítimas não reajam, nem no quadro das relações de trabalho, nem através dos mecanismos legais, resultando na ineficácia dos instrumentos legislativos, na impunidade dos agentes e na desprotecção das vítimas.
A temporalidade do fenómeno é outro problema, porque há situações em que o assédio não assume repetitividade, consumando-se num acto único e visível para todos, visando gerar um efeito de paralisia do colectivo. O fenónemo é intencional e praticado para fragilizar moral e psicologicamente o assediado, visando objectivos pessoais ou organizacionais.
A pressão, o stress, os objectivos e metas difíceis de atingir, as crises económicas e financeiras, as reestruturações empresariais, as novas tecnologias, a mudança radical nas formas de organização do trabalho e a utilização de novas técnicas de gestão de dominação (avaliação individual do desempenho, qualidade total como objectivo e não meta referencial, reestruturações com demissões e realocação de pessoal e terciarização/precarização de serviços), incrementaram atitudes e comportamentos intencionalmente conducentes ao assédio moral no trabalho, determinando a supressão de solidariedades e abrindo espaço ao autoritarismo.
Parece inequívoco que todos os relatos são conotados com situações de abuso de poder, e é inquestionável a associação das situações de violência e deterioração das relações aos estilos de liderança autocrática. Efectivamente, a cultura organizacional e o exercício da liderança afiguram-se decisivos. O exercício do poder sem balizas éticas e a falta de formação das chefias mostram-se fulcrais na facilitação do assédio moral, bem como a ausência de fiscalização, originada pela dificuldade de se identificar o fenómeno e de se obter testemunhas disponíveis.
As instituições de apoio à vítima apontam os custos e as consequências do assédio, sobretudo o clima de stress e de medo, que quebra os laços sociais, destrói a noção de equipa e gera desequilíbrios psicológicos graves com quebra de confiança, menor produtividade e problemas que podem levar à depressão e até mesmo ao suicídio.
Acresce que o assédio moral é protegido em certos departamentos de gestão de recursos humanos em tempo de reestruturações que forçam despedimentos, bem como se treina dirigentes, em diversas partes do mundo, para melhor dominar as potenciais vítimas.
Face a tais realidades, é fundamental que a empresa valorize o capital humano e reforce a auto-estima dos trabalhadores, protegendo-se do assédio moral. Tal perspectiva é essencial para se desenvolverem práticas envolvendo os stakeholders na procura de consensos e compromissos, que canalizem energias para projectos comuns. As novas empresas usam técnicas fundadas na transparência, responsabilidade e desenvolvimento ecossocioeconómico num quadro ético e de resgate do rosto humano da empresa.
Acresce, finalmente, que a AESST refere a crescente importância dos riscos psicossociais e a OIT reconhece que o assédio moral é um dos grandes temas emergentes no século XXI no que respeita a problemas de saúde no trabalho.
[1] Rui Moura (coordenador científico do estudo) é o Coordenador da ‘Linha de Investigação das Condições de Trabalho’ na Universidade Autónoma de Lisboa; Célia Quintas, Dilar Costa e Luísa Ribeiro são membros da ‘Linha de Investigação das Condições de Trabalho’.
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